A Parashá Bereshit, que abre o livro de Gênesis, é uma das porções mais ricas e inspiradoras de toda a Torá. Com ela, somos convidados a explorar o início da criação e os fundamentos da nossa existência. Cada versículo traz não apenas uma descrição da criação, mas profundos ensinamentos sobre o propósito da vida e nosso relacionamento com o Criador, com o próximo e com o mundo ao nosso redor.
1. O Início da Criação: Reconhecendo a Fonte de Tudo
"No princípio, D'us criou os céus e a terra."
בְּרֵאשִׁית בָּרָא אֱלֹהִים אֵת הַשָּׁמַיִם וְאֵת הָאָרֶץ׃
(Gênesis 1:1)
Este verso é o alicerce de toda a criação, apontando para o fato de que o mundo tem uma origem divina. A Guemará ensina, em Chaguigá 12a, que este verso nos lembra da unidade de D’us e da necessidade de compreender que o universo não é autossuficiente, mas depende de D’us em todos os momentos. Rashi, o grande comentarista da Torá, destaca que o termo “Bereshit” indica uma motivação pela qual D’us criou o mundo: para a Torá e para o povo de Israel, ambos mencionados como "reishit" (primeiros).
D'us criou o universo e todas as suas complexidades, e o fez com um propósito. Este propósito é contínuo e se aplica a cada ser humano. Ao percebermos isso, podemos viver com um sentimento de propósito, sabendo que cada ato de bondade e aprendizado da Torá está alinhado com o plano divino.
O primeiro ensinamento da Torá nos convida a contemplar o mundo ao nosso redor com um olhar de gratidão e reverência. O Rabino Moshe Chaim Luzzatto, no "Caminho dos Justos" (Mesilat Yesharim), ensina que a primeira etapa para uma vida espiritual é o reconhecimento de D’us como Criador e Sustentador. Assim, ao despertar a cada manhã, devemos nos lembrar de que cada dia é uma nova criação.
2. A Luz Divina: A Sabedoria como Luz na Vida
"E D'us disse: ‘Haja luz!’ E houve luz."
וַיֹּאמֶר אֱלֹהִים יְהִי אוֹר וַיְהִי אוֹר׃
(Gênesis 1:3)
D’us traz luz ao mundo como primeiro ato da criação ativa, um gesto que simboliza a revelação da sabedoria. Na Torá, a luz é frequentemente associada ao conhecimento e ao entendimento espiritual. O Talmud, em Eruvin 54a, compara a Torá à luz, declarando que “aquele que estuda a Torá durante a noite, D’us atrai sobre ele uma linha de graça durante o dia.”
A luz é uma metáfora para a sabedoria e para o entendimento divino. Quando trazemos a luz do estudo e da compreensão para nossas vidas, dissipamos as trevas da ignorância e da confusão.
Assim como D’us criou a luz e a tornou disponível, também temos a responsabilidade de cultivar a nossa própria “luz” interna. O Rabino Israel Salanter, fundador do movimento Mussar, ensina que cada um de nós deve buscar continuamente melhorar nosso caráter e compartilhar nossa luz com o próximo. Em um nível prático, isso pode significar agir com paciência e compreensão, buscando sempre o crescimento moral e espiritual.
3. A Criação do Homem: A Dignidade de Cada Ser Humano
"E D'us criou o homem à Sua imagem; à imagem de D'us o criou; homem e mulher os criou."
וַיִּבְרָא אֱלֹהִים אֶת־הָאָדָם בְּצַלְמוֹ בְּצֶלֶם אֱלֹהִים בָּרָא אֹתוֹ זָכָר וּנְקֵבָה בָּרָא אֹתָם׃
(Gênesis 1:27)
Este verso nos revela a origem da dignidade humana. O Talmud, em Sanhedrin 37a, enfatiza que cada pessoa é única e insubstituível, ensinando que "aquele que salva uma vida, é como se tivesse salvo um mundo inteiro." Ser criado “à imagem de D’us” significa que cada ser humano possui um valor intrínseco e um potencial divino.
Devemos enxergar o próximo como um reflexo de D’us e, portanto, tratá-lo com respeito e dignidade. Este ensinamento nos convida a olhar além das falhas aparentes e ver o valor essencial que todos carregam.
Ao reconhecer a imagem de D’us em cada pessoa, exercitamos um dos princípios mais elevados: o respeito e a compaixão. O Rabino Chaim Shmulevitz enfatizava a importância de “amar o próximo como a si mesmo” (Levítico 19:18), vendo-o com um olhar bondoso e acolhedor. Agir com bondade para com os outros, mesmo quando isso exige esforço, é um reflexo de nossa própria divindade.
4. O Shabat: Encontrando Descanso e Equilíbrio Espiritual
"E no sétimo dia, D'us terminou a obra que fizera e descansou no sétimo dia de toda a obra que fizera."
וַיִּשְׁבֹּת בַּיּוֹם הַשְּׁבִיעִי מִכָּל־מְלַאכְתּוֹ אֲשֶׁר עָשָׂה׃
(Gênesis 2:2)
O Shabat é mais do que um dia de descanso; é um tempo sagrado dedicado ao crescimento espiritual e à conexão com o divino. A Guemará em Shabat 10b nos lembra que o Shabat é um presente que D’us deu ao povo de Israel, um tempo de introspecção e conexão com os valores que nos sustentam.
O Shabat é um convite ao equilíbrio e à renovação. Ele nos lembra que, embora o trabalho seja importante, o descanso e a reflexão são essenciais para uma vida espiritualmente equilibrada.
O Shabat nos ensina a importância do autocuidado e da disciplina espiritual. O Rabino Eliyahu Dessler escreve em "Michtav MeEliyahu" sobre a necessidade de separar um tempo para o crescimento espiritual, para que possamos refletir sobre nossas ações e redefinir nossos objetivos com clareza. A pausa no Shabat nos convida a renovar nosso relacionamento com D’us, com nossos entes queridos e, principalmente, conosco mesmos.
Conclusão
A Parashá Bereshit não é apenas uma narrativa sobre a criação do mundo; ela é um convite a refletir sobre o propósito da vida e a nossa conexão com o Criador. Cada versículo traz uma lição profunda, e os ensinamentos de Mussar e da Guemará nos ajudam a aplicar essas lições em nossa vida diária.
Ao estudar Bereshit, aprendemos que a criação foi feita com amor e propósito. Somos chamados a honrar a D’us, a buscar a sabedoria, a tratar cada ser humano com respeito e a encontrar momentos de renovação e equilíbrio. Esses ensinamentos permanecem tão relevantes hoje quanto eram no início da criação.
Que possamos todos, ao estudar esta porção, nos aproximar do Criador e nos inspirar a viver com propósito e gratidão, reconhecendo a luz divina em tudo que existe.
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